quinta-feira, agosto 17, 2006

Expressões da região criciumense

Jornal de Cocal: 17 de maio de 2006

Uma palavra nova é acrescentada, automaticamente, ao vocabulário de quem passa a conviver com o povo da região de Criciúma: bobiça.
O vocábulo “bobiça” não pertence à lista oficial da Língua Portuguesa. É inútil procurar a grafia correta nos dicionários. Provavelmente, ele seja a distorção de bobice, que significa uma coisa sem importância ou supérflua.
Quando uma pessoa é contestada por ter expressado uma opinião, vem a crítica: “Quanta bobiça você está falando!” Costuma-se, dizer: “Passei no um e noventa e nove para comprar algumas bobiças.”
Bobiça pode ser, também, o filme que não agradou, os brincos vendidos pelos camêlos, uma música sertaneja, um programa de televisão, um comercial mal produzido e as conversas sem compromisso trocadas nos ambientes informais.
Há até quem classifique as árvores da Praça do Congresso, como bobiças: “Eu acho essas árvores uma bobiça!” Aqui, pode haver uma dupla interpretação: elas são lindas ou atrapalham de algum modo?
Outro aspecto comum nas falas criciumenses é a colocação do pronome pessoal se, antes e depois do verbo:
- Ele se quebrou-se o braço na pista de skate.
- Ela se matou-se por causa da cachaça.
- Eles se esconderam-se atrás da porta do banheiro feminino.
- Elas se arrumaram-se para a festa de aniversário das primas gêmeas.
- Eles se machucaram-se numa briga feia.
Pessoas oriundas de outros lugares, ao ouvirem essa repetição, questionam: “Ele quebrou o braço duas vezes? Ela se matou duas vezes? Ainda estão imitando o Giovani Improta, da novela Senhora do Destino?”
Existe outra expressão interessante e comumente usada para falar de um ponto de referência, por exemplo: “Você quer saber onde fica o Edifício Ipanema? Não tem, o antigo Bistek? É lá perto.” Outras vezes, é usada desnecessariamente: “Eu estava fazendo um lanche. Não tem? Daí, o celular tocou. Não tem? Era a minha mãe querendo saber onde eu estava. Não suporto mais essa marcação. Não tem?”
Não podemos ignorar um vocativo usado para demonstrar carinho com o interlocutor:
- Senta aqui, Cheirinho! A Diretora já vai lhe atender.
- Ô, Cheiro! Onde está a conta de luz? Até ontem estava na porta da geladeira.
- Meu Cheirinho, venha me dar um abraço gostoso. Eu estava com muitas saudades desse safadinho.
O professor Pasquale Cipro Neto, apresentador do programa Nossa Língua Portuguesa, da TV Cultura, diz que ninguém deve sofrer preconceito por não conhecer a linguagem culta e que as diferentes maneiras de usar as palavras devem ser respeitadas, pois são elas que dão identidade a cada povo. Salienta, também, que devemos saber aplicar corretamente a língua materna para desenvolver textos formais.
As palavras surgem e sofrem transformações. Algumas são legitimadas pelo corrente uso popular. Talvez, um dia, o dicionário receba o vocábulo bobiça e acrescente um novo sentido ao termo “cheiro”.

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